SUPERSTIÇÕES
Como sucede geralmente noutras regiões portuguesas, o povo do concelho do Sabugal é também, mais ou menos, supersticioso, para o que muito contribui ainda a ignorância e falta de instrução, hoje mais atenuadas que noutros pontos do país.
O povo acredita em bruxas e feiticeiras, como em lobisomens, mouras encantadas, trasgos, etc.
Não são raras por isso as mulheres e homens de virtude, bentas, bentos e quejandos exploradores da crendice popular, que apesar de diminuída nos últimos tempos, ainda se nota em toda a parte.
A dona da casa não urde a teia,
nem casa a filha, em terça-feira;
não pode ver o pão colocado com o solo para cima,
devendo-se-lhe acudir antes do que a uma criança no lume,
e tem como mau agouro que um defunto leve os olhos abertos ou mal fechados;
acredita que os restos da fogueira do Natal, cinza, carvão e trepolas carbonizadas, grossos pedaços de ramos de carvalhos, preservam do raio
e que o fumo do rosmaninho e bela-luz, queimados nas noites de S. João e S. Pedro, curam as sesões e a sarna, assim como o orvalho dessas noites.
Onde houver machados e outros instrumentos de pedra, que ainda aparecem neste concelho e são considerados como raios, faíscas, coriscos ou centelhas, conforme o tamanho e forma que apresentam, não há perigo de cair raio.
Apesar de muito religioso, o povo não tem mais fé na Magnificat que nestes antiquíssimos instrumentos, para se livrar do raio e por isso dificilmente se priva deles.
O palavreado de que, novos e velhos, se servem em noites de S. João e S. Pedro, quando saltam sobre as fogueiras, não é uniforme, mas a fórmula mais usada é:
Sarna em vós (1)
Saúde em nós
Rapariga que no 1.° de Janeiro, de madrugada, lança farinha às portas dos vizinhos, há-de casar depressa e ser feliz e é sempre mau agouro que a primeira pessoa a entrar em casa nesse dia seja mulher.
Há por isso muitos rapazes que, conhecedores desse prejuízo, logo de manhã visitam os vizinhos e amigos, que agradecem sempre e lhes oferecem vinho ou aguardente, que nunca se recusa em tempo tão frio.
(1) - «Os antigos acreditavam que se purificavam de toda a mancha física e moral, saltando através (ou sobre) a chama sagrada.. Fustel de Coulange - «A cidade antiga», pág. 154. Vem, pois, do paganismo o uso de saltar as fogueiras.
FONTE:
TERRAS DE RIBA-CÔA. MEMÓRIAS SOBRE O CONCELHO DO SABUGAL
Joaquim Manuel Correia - Lisboa 1946